segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

Que Venha 2015.

Vai parecer conformismo o que vou dizer, mas tenho certeza que a maioria vai entender: com o passar dos anos, muita coisa vai perdendo importância na nossa vida. Essa frase parece pessimista mas não é. Muito pelo contrário. 

Até uma certa idade, nossos desejos são a longo prazo. Pensamos de forma grandiosa, extensiva, intensa. Tudo que é importante fica muito importante. O que é intenso, muitas vezes, acaba ficando pesado. As características se tornam exigências, como se fôssemos capaz de ter do mundo o que a gente acha certo. Perde-se muito tempo e energia. A sorte é que somos assim quando jovens, e temos mais energia por natureza. 

Com o passar dos anos, tudo começa a mudar. A primeira coisa que muda é a nossa (real) necessidade de paz. Pode reparar; a maioria das pessoas a sua volta, com mais de 30 anos, respondem “paz” quando perguntadas do que mais desejam para a vida. Eu sou uma delas. Minha paciência com assuntos aleatórios (e que muitas vezes nos consomem muita energia) caiu assustadoramente. Passei a ser mais sincera, e menos insistente; inclusive para as minhas próprias discussões internas. Pensar, polemizar, causar cansa. A gente vai cansando de gastar tanta energia em tanta coisa. 

A grande verdade é que a gente se torna seletivo. Por exemplo, no começo, você quer que todo o mundo goste de você. Depois você entende que isso é impossível. Só pede uma dose de respeito (caso não goste), e vida que segue. 

As polêmicas em torno de “eu não tenho a mesma importância na vida dela como ela tem na minha” diminuem drasticamente. A coisa funciona mais ou menos assim: "olha, não sei você, mas eu gosto de você”. Não tem mais aquele sentimento “ah, eu não vou falar que gosto de fulano… vai que ele não gosta tanto de mim.. Aí vai ficar sabendo que eu gosto dele…”. Se não gostar, que merda. Mas paciência. Pelo o menos a mensagem é sincera e clara: "eu gosto de você. Se você gostar de mim, ótimo. Vamos nos falando. Caso contrário, é só não me procurar. Silêncio também é resposta”. A mais dura das respostas. Mas, sem dúvida, é resposta. E com ela, eu me entendo. 

Nada que não é genuinamente recíproco sobrevive. Não adianta gostar sozinho, insistir sozinho, semear sozinho. A reciprocidade é o caminho da eternidade. 

Outra coisa que muda é a sua capacidade de tentar infinitas vezes. Ela passa a ter limite. Você tenta uma, duas, três e pronto. É bem verdade que o limite das pessoas varia muito. O meu é infinitamente maior do que de muita gente. Mas mesmo sendo um limite distante, ele existe. E mais que isso, ele chega. E quando ele chega, você consegue falar aquela frase tão corriqueira - “Eu tentei de tudo, mas não consegui”- sem sentir remorso. Ela não soa como derrotismo. É bem verdade que ainda sentimos muito pelo ocorrido, mas quando sabemos que fizemos todo o possível, a tranquilidade, mesmo que triste, prevalece.

A verdade é que da maturidade vem a aceitação do seu limite. Da aceitação do seu limite vem a noção real de liberdade. E da noção real de liberdade vem a verdadeira paz. 

Desistir muitas vezes é optar por ser livre. Pouquíssimas causas merecem tentativas eternas, assim como pouquíssimas pessoas merecem tantas chances na sua vida. E, se alguém merece, esse alguém certamente é você. A gente pode, e deve, desistir do que nos desgasta. O que não dá é para desistirmos de nós mesmos. 

O ano tá acabando… Esse é o momento certo para a gente pensar e avaliar o que realmente vale a pena levar adiante, e o que pode (e deve) ser deixado pra trás. 

Feliz ano novo. Um 2015 cheio de paz.





domingo, 23 de novembro de 2014

Nos embalos de sábado à noite.

Sábado à noite, o telefone toca.


- Oi, filha. Tudo bem?
- Tudo, mãe. E aí?
- Tudo bem... Eu comprei um livro virtual na Saraiva. Menina, não consigo ler...
- Ah, deve ter que baixar algum aplicativo.
- Aplicativo? Eu baixei um tal de Saraiva Reader. 
- É isso.
- Mas não funciona, Marina. Já liguei, já reclamei... Não consigo. Agora me chega um email aqui da Saraiva com umas 10 perguntas para me ajudar. A primeira pergunta é qual o modelo do meu computador. Pelo amor de Deus, né? Até parece que eu sei isso....
Outra: "qual seu login no aplicativo?". Aplicativo?? Eu desconheço esse nome, gente...
- Mas, mãe, vc não disse que baixou?
- O Saraiva Reader? Isso é o aplicativo? Eu sei lá! Eu só quero saber onde eu leio o livro que comprei. Tá escrito lá "disponível para download". Mas, Marina, a setinha NÃO CLICA!! Como assim?? Eu não encontro o livro que comprei.....
- Mãe, olha só....
- Ah, quer saber, a gente tenta ser moderna, acompanhar a evolução da tecnologia, mas esse povo não ajuda. Brincadeira esse email... Eu simplesmente não sei o que responder a essa moça. Vou colocar assim: Olha, eu não sei nada do que vocês estão me perguntando. Só quero ler o livro que comprei, POR FAVOR."
- Mãe..... - eu já não conseguia falar.
- E outra, a mulher fala aqui no email que poderia me ligar na segunda-feira. Mas  o que eu vou falar com ela, meu Deus? Eu não sei responder nada do que ela quer saber... Ah, não quero que ela me ligue. Que saco. Marina...?!

Eu realmente não conseguia mais falar.

- Ihhhh tchau, Marina. Se não ajuda, não atrapalha. FUI. 
E desligou. 

Fiquei rindo sem parar por mais uns 20 minutos. 

Se eu pudesse eu promoveria o encontro de Dona Nanci com o mestre Woody Allen. Não sei por que mas acho que os dois se dariam bem... Não concordam?



quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Na levada do AMEX...

Minha mãe recebeu um novo cartão de crédito do AMEX. A cartinha que veio junto com o cartão dizia que era preciso ligar para a central do cartão para desbloquea-lo. Ela fez isso.

Lá estava ela cumprindo o normal (e chato) procedimento de confirmação de dados pessoais para provar que você é você mesmo.

- Sim, Nanci Cherfen, sou eu.
- O que, o endereço? Rua Conselheiro Lafaiete X/Y. 
- …..
- Que? Como assim? Vou falar de novo: Rua Conselheiro Lafaiete X/Y. 
- ….
- Como assim, minha filha? Você está duvidando da informação que eu tô dando? Eu sei muito bem onde moro…

Eu estava ao lado, sentada no computador. Mas já tinha entendido tudo que estava acontecendo. 

- Minha filha, qual o endereço que está cadastrado aí?
- …..
- Ué, como não pode dizer???? É o MEU ENDEREÇO!!!!!

Ela, que já fala alto, já estava gritando…

- Mãe, calma…
- Marina, olha isso! A moça está falando que eu não sou eu!! Minha filha, eu sou eu!!!!! Nanci Cherfen!!! Moro na Rua Conselheito Lafaiete X/Y!! Que endereço está aí? Se não está esse, minha filha, está errado! Você tá duvidando da minha sanidade, é?
- ….
- MARINA!! Ela tá falando que eu não moro aqui… Fala pra ela, Marina!

Coloquei no viva voz…

- Oi, moça. É a filha dela. Mas não sei se está cadastrado aí que ela tem filha não, viu? Ela mora nesse endereço sim… 
- Mas, infelizmente, o endereço não bate com o que está cadastrado no sistema, senhora. 
- Nesse caso, se faz o que?
- Infelizmente, abrir um pedido de análise.
- AHHHHHHH MEU DEEEEEEUS – gritava Nanci do lado de cá.
- Calma, mãe!!!!!!!! Mas moça, isso é um absurdo! O retorno demora quanto tempo?
- Até 5 dias úteis, senhora.

Nanci assumiu a ligação de novo:

- Ahhhh minha filha, vocês estão de palhaçada… Não quero mais nada não, ok? Pode inclusive cancelar esse cartão. Tchau.

E desligou.

Dois dias depois, o AMEX ligou informando que houve um erro interno e que o cartão estava desbloqueado. Ela repetiu essa história inteira pro atendente que ligou, mas acabou tudo bem. 





quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Sobre ser taurina

Desde pequena, eu ouvi que demonstrar afeto, quando realmente existe afeto, é uma coisa legal. Pro taurino, ser óbvio não é difícil. Ele é naturalmente transparente. Se ele gostar de você, você vai saber na hora. Se não, ele até disfarça mas se mantém notavelmente afastado. 


Acontece que o taurino tem uma característica que, até outro dia, eu achava bem positiva. A gente conhece as pessoas de peito aberto. É muito raro você encontrar um taurino que fale gratuitamente: "não fui com a cara dele". É um signo de pessoas abertas a conhecerem pessoas novas, e sempre partem do principio que são pessoas que podem valer a pena. Eu sempre curti isso no meu signo. Dentre tantas características complicadas, essa sempre me agradou. Eu gosto de conhecer pessoas, gosto da comunicação entre as pessoas, gosto da essência que torna o ser humano um bicho sociável. 

Mas, de uns tempos pra cá, conforme vai vivendo, você entende que partir do princípio que as pessoas são essencialmente bacanas pode te trazer surpresas bem desagradáveis. E ai, você começa a entender que não dá pra sair curtindo qualquer pessoa que você conhece. Que mais vale ficar na sua, ir conhecendo bem aos poucos e, se realmente valer a pena, você vai se soltando. 

Pra um taurino isso é um puta desafio. Ser mais ou menos não faz parte da nossa essência. Mas isso não é um elogio não. Ser desse jeito tem um preço, e alto. A gente toma muita porrada por ser assim. Aí, aos poucos, a gente vai ficando mais ressabiado, mais contido, mais desconfiado, mais neutro.

Eu tenho me tornado uma pessoa mais neutra de uns tempos pra cá. Ninguém gosta de ficar tomando porrada, concorda? E vou te contar, o mundo tá cheio de pegadinhas... 

Na tentativa de ser neutro, o taurino tende a se fechar. Desconfia. Mantém o pé atrás. Ou quase os dois. Ou acaba cobrando pra tentar se garantir. Demonstra menos afeto. Se relaciona "mais ou menos". Tudo que ele não sabe essencialmente fazer. 

Costumo falar que se relacionar é uma arte. Mas se relacionar com tanta cautela, pro taurino, é uma arte abstrata. A gente quando gosta, GOSTA. Quando é amigo, É AMIGO. Quando chora, CHORA. Quando erra, SE CULPA. E pede desculpa. E se explica (até demais). A verdade é que o taurino é ou não é. A gente pode até aprender a ser ponderado. Mas essa é, sem dúvida nenhuma, uma característica nata do aquariano.

O mundo tem me "exigido" a ser "mais ou menos". E a verdade é que, sendo mais ou menos, a gente acaba ficando menos a mercê do que os outros são ou não são. Dói menos. Mas se vive menos também. 

Em todo taurino existe uma vontade imensa de ser intenso, de mergulhar fundo, de ser verdadeiro, de deixar tudo muito bem explicado. A gente é fã da demonstração de afeto genuína e julga impossível haver qualquer tipo de perda nesse tipo de demonstração. Pro taurino, viver é expressar o que sente, seja por palavras, por ações, por atitudes ou, dificilmente, por silêncio. 

O mundo insiste em me provar que ganho mais sendo "mais ou menos". Mas confesso, do fundo do meu coração taurino, que ainda me questiono bastante se vale a pena. 




segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Eu, Marina, e o copo de bebida alcoólico na mão.

Até os meus 27 anos, eu era uma jovem que não bebia. Quer dizer, bebia muuuuuuuito raramente, e era capaz de ficar altinha com 1 Smirnoff Ice (eta fase barata!!). 

Namorei durante 8 anos, e só comecei a beber (mesmo) depois que fiquei solteira. Você começa a sair, ter que ficar de pé até quase de manhã...
É bem verdade que isso sempre foi algo super possivel no meu caso, mesmo sem álcool. Mas, verdade seja dita, que com ele tinha se tornado uma missão bem mais simples, tinha. 

Pra uma mãe, ter uma filha (única) de 27 anos que não bebe é quase uma dádiva, concordam? Dona Nanci demorou muito a aceitar que a filhinha dela tinha começado a beber aos 27 anos. Principalmente porque ela não bebe. Ou melhor, bebe só aquelas bebidinhas que são praticamente uma sobremesa com zero 0,1% de álcool. 

Já meu pai sempre me dizia:

- Minha filha, tem que beber um pouco... Nem que seja socialmente.... Que isso...

Minha mãe exterminava meu pai quando ele dizia isso perto dela. 

Voltando. Quando uma pessoa fica solteira, é mais do que natural que ela comece a sair, estar mais com os amigos, postar mais fotos "de galera" no facebook, concordam? É bem verdade que hoje em dia o Face anda meio chato, mas "naquela época" era uma super novidade. Principalmente pra mim, que entrou no Face também depois de ficar solteira.

Vocês devem estar pensando: essa daí foi viver a vida depois que ficou solteira. Não é bem por aí... Mas é bem verdade que descobri muita coisa a partir dos meus 27 anos. 

Eu saia com a minha irmã, de 16 anos. De de certa forma, estavámos passando por fases bem parecidas. Sendo assim, volta e meia "aparecia" uma foto minha no Facebook segurando alguma bebida. Totalmente normal, acho eu. Mas pra minha mãe, não. 
Era eu postar uma foto....

Triiiiiimmmmm
- Oi, mãe.
- Alô, Marina? Marina, você tá me ouvindo???
- Mãe, tá meio barulho... Eu tô no samba, que foi? Tá tudo bem!
- Marina, Marina....?!

Eu desistia e ia prum lugar que a conseguisse ouvir.

- Fala, mãe. 
- Marina, olha..... Eu vou ser direta, sabe? Eu vi aqui uma foto sua no Facebook.... Sinceramente...
- O que, mãe?!?!
- Olha, Marina... Sinceramente, eu não acho legal você ficar postando foto segurando copo com bebida álcoolica na mão não....
- Ah, mãe, pelo amor de Deus!!!! É só uma caipirinha!!! Eu tô no samba, tá tudo bem!
- Olha, eu não concordo. Acho que não precisa disso....
- Tá bem, mãe. Tá bem. Não vou mais postar (hoje).

Ela desligava, como sempre, na minha cara. Devia perder a noite pensando na foto do Facebook....  Eu realmente evitava mais fotos naquele dia. Mas só naquele dia, porque no outro já tinha esquecido.

Aos poucos, dona Nanci foi relevando as postagens com "copo de bebida alcóolica na mão". Até que, na inesquecível festa de 10 anos de formatura do colégio alguém postou uma foto minha, com as minhas amigas, segurando uma capirinha (era a única bebida que eu curtia no começo). Meu chefe da época comentou:

- Quem te viu, quem te vê.

Quem me conhecia tinha entendido. Eu realmente tinha mudado bastante, mas era unânime a minha mudança pra melhor. Eu entendi perfeitamente o que ele quis dizer quando escreveu aquela frase. Eu realmente estava numa fase muito importante da minha vida. Não tinha a ver com a bebida ou com qualquer outro ponto externo a mim. Era algo interno, eu comigo mesma. Era o meu momento.

Mas, claro, minha mãe interpretou super mal.

Triiiiiimmmmmmmmm, Triiiiimmmmm, TRIIIIIMMMMMMMMM....

- MA-RI-NA, você está me ouvindo direito? Vai prum canto AGORA... Você viu o que o Sergio comentou na foto, Marina?!?! Ahhhhhhh Meu Deus.....
- Hahahahahahahah, mãe...
- MA-RI-NA, você tá rindo? Eu não acho a mínima graça... Ele é seu chefe, Marina... Imagina o que ele deve estar pensando....!!!!
- HAHAHAHHAHAHHAHHA
- Realmente.... eu não concordo.
- Tá bem, mãe.... Mas eu entendi o comentário dele.
- Sei...... Bem, tchau.

E desligou na minha cara, como sempre fez e faz até hoje. Confesso que eu espero que ela faça pra sempre, porque já acostumei. Não conseguiria mais ouvir um: "Tchau, filha, um beijo". Não dá. Tem coisas que se mudarem depois de muito tempo causam um estranhamento imenso. Dispenso.

O tempo passou... Hoje ela vê fotos minhas com "copo de bebida alcoolica na mão" e o celular não toca mais. Eu aposto que o coração dela não sorri, mas ela já aceitou ter uma filha de 32 anos que bebe. UFA!

Em 2010, na festa de 10 anos de formatura do colégio.


domingo, 28 de setembro de 2014

Um post sobre o Dia dos Pais. Ou melhor, Dia dos Dois Pais.

Quem escreve sabe que, se você não tiver inspirado, não há obrigação que o faça conseguir escrever. Digo isso quando o “escrever” é um hobby. Todo jornalista tem na cabeça um lead para cuspir qualquer matéria a qualquer momento. Mas, sem dúvida alguma, quando a inspiração vem é quando saem as matérias mais bacanas.

O Dia dos Pais passou, mas não consegui escrever. O ritmo do trabalho tava tão intenso, que a vida se resumia a casa x trabalho, trabalho x casa. Coisa que a partir de agora tem previsão e determinação (minha) de mudar.

De qualquer forma, a pauta “Dia dos Pais” estava como pendente na lista do meu blog. Não como obrigação, mas como assunto que eu queria palavrear quando a vida profissional tivesse mais calma. Cá estou eu, então.

Eu tenho dois pais. Um de sangue e de vida, e um só de vida.

Waldyr é meu pai de vida desde os meus 5 anos. Com ele aprendi na prática a teoria do velho ditado “pai é quem cria”. O sangue tem o seu valor, mas se não houver presença, há falta. E da falta, não restam lembranças, afeto ou aprendizados.

Sabe aquele sonho de ver seu pai e sua mãe juntos de novo? Eu nunca tive. Por um simples motivo: Waldyr. No começo dei aquela rejeitada básica, não quis ele muito perto de mim ou da minha mãe, mas logo tudo mudou, e Waldyr ocupou um lugar cativo no meu coração e na minha vida.

Correto como ninguém que conheço, sempre me mostrou o caminho da honestidade, o lado íntegro da vida. Waldyr não gostava sequer de mentir ao telefone!

Trimmmmm
- Dy, atende. Se for pra mim, fala que não tô.
- Eu não... Você está. Se não quer falar, diz que não quer e pronto. Mas eu não vou mentir não...

Na época, eu morria de raiva mas hoje o admiro por isso. É claro que ele foi ponderando, e hoje já é capaz de falar que eu não tô se alguém me ligar e eu não quiser atender. Mas sempre que isso acontece, eu lembro que a essência dele não é essa.

Waldyr me apontou a direção da correção, mesmo muitas vezes eu achando que era exagero. Me ensinou que, ser honesto e íntegro são virtudes que poucos têm. 
Alem de tudo isso, me ensinou a ver a Matemática de forma mais simples (ou melhor, tentou, porque eu ainda continuo achando dificílimo), me ajudou nos problemas (insolúveis) de Física, treinou comigo o inglês que eu aprendia no cursinho, tentou (só tentou porque não conseguiu) me ensinar russo e alemão, e deu um dos apelidos que mais gosto: Mara Pirua.

Até hoje, quando ligo ou trocamos e-mails, ele me chama de Pirua. Muita gente acha engraçado, e pensa no lado pejorativo do apelido, mas eu sei bem o que está dentro dessa palavrinha. E é só sentimento bom.
Obrigada, Dyzinho, por tudo.

Já meu pai de sangue é o Clersio, e foi quem me fez entender o Complexo de Édipo à sua melhor maneira: vivendo. Eu sou louca pelo meu pai. Mas não foi sempre assim.

Meu pai era bem rígido quando eu era pequena. Não rigido na educação ou na forma de ver a vida (pelo contrário), mas na forma de ver o mundo. Ele era rígido com ele mesmo, o que passava diretamente às pessoas com quem ele convivia. 

De esquerda, ainda na fase áurea e firme de sua ideologia, tinha posições muito categóricas do mundo e de como as pessoas deveriam reagir a esse mundo. Eu, criança, tinha muita dificuldade em entender e aceitar aquela forma de vida, o que logicamente levava a um afastamento entre nós. Eu era filha única de um pai cheio de ideologia, que acreditava que ainda era possível mudar o mundo.

32 anos depois, hoje sou a mais velha de 4 filhos. A ideologia do meu pai é a mesma, mas a postura é outra. Acho que todo mundo acaba "amolecendo" quando vê que, por mais que você lute muito, o rumo da realidade não está sendo o que você sempre quis. Acho que vamos entendendo que somos partículas, e não havendo união com organização, a ideologia acaba ficando sempre como ideologia.

Meu pai lutou (e ainda luta) muito por um Brasil melhor, mas acho que vendo o rumo do país escolhido pela maioria do seu povo, ele entendeu que ninguém é capaz de mudar o todo quando as partes estão tão segmentadas, perdidas e mal organizadas. Ele continua fazendo o papel dele, mas acho que entendeu que essa batalha, infelizmente, ele não vai ganhar.

É claro que nem por isso ele se tornou uma pessoa passiva ou ideologicamente morna. Acho (porque tudo que tô escrevendo é o MEU ponto de vista) que ele aceitou que o poder de mudança dele tem limites, e resolveu viver da melhor forma com isso.

Eu só digo uma coisa: ainda bem que eu tô dentro da linha de atuação do meu pai. Agradeço muito por isso. Sempre morei na Zona Sul, estudei em colégios e faculdade particulares, mas nunca deixei de saber o que acontecia fora da “bolha” em que eu estava. Meu pai sempre me dizia: você vai ter a melhor criação do mundo, porque seus pais hoje podem dar isso a você, mas não vai ser menininha Zona Sul alienada não.”

Confesso que várias vezes eu ouvia isso e sentia um peso imenso nas minhas costas, mas hoje agradeço muito por meu pai ter sido tão realista (e até mesmo enfático) comigo. Era comum nos finais de semana, ele me pegar e irmos de trem até “aquele lugar que eu não sabia o nome” e, no caminho, ele ir me explicando toda a historia dos lugares. Às vezes, o passeio era de ônibus e ele ficava todo o tempo apontando os lugares e contando a história de cada um deles. Pra quem não sabe, além de sociólogo, meu pai é professor de História e Geografia.

Outra vezes íamos ao Jardim Botânico catar os jambos que caiam das árvores, ou ao teatro ver Intrépida Trupe, ou ao Bar Lagoa comer frango a passarinho, ou à praia no Posto Nove, com direito a sanduíche de linguiça na barraquinha do uruguaio Milton e Bar do Beto depois. Era sempre eu, ele e um bando de amigos dele. Acho que nenhuma criança se envolve em papos de adultos enquanto é pequena, mas ter crescido num ambiente onde se discutia tanto o rumo do país, as condições sociais do Brasil, e as possíveis soluções para tanta desigualdade fez de mim quem eu sou.

Tô longe de ser uma ativista política, mas graças ao meu pai (e a minha mãe e meu padrasto – para ser justa) tenho consciência do país e do mundo em que vivo. Agradeço muito aos meus pais por ter a vida que tive, mas principalmente por viver essa vida tendo a real noção de como o mundo é “lá fora”.

Se Waldyr me indicou sempre o caminho da honestidade, Clersio me indicou sempre o caminho da solidariedade. Como ele mesmo diz, “tão fora de moda hoje”.

- Minha filha, se todos partissem do principio que ninguém é melhor do que ninguém, o mundo certamente seria bem melhor.

Obrigada, pai. Como você disse ao vovô quando ele faleceu: “Prometo criar meus filhos (e continuar criando a mim mesma) de acordo com os valores com que você me criou.”

Êta sorte a minha! Dois pais, um milhão de lições de vida.

Clersio à esquerda, Waldyr à direita e uma filha muito feliz entre seus dois pais.

terça-feira, 2 de setembro de 2014

E tá chegando o Natal....!

Era um sábado de dezembro. Minha mãe em Juiz de Fora e eu no Rio. Acho que isso faz uns 5 anos... Lembro que eu estava em casa, acordando eu acho. Meu celular tocou.

- Marina, tá acordando agora?
- Tô, mãe, por quê????
- Ihhhhhh eu já tô na rua.... Encomendei algumas coisas pro Natal aí em casa... Já tô a mil....
- Sei, mãe.... ã.....
- Olha, mas te liguei porque tem uma pessoa querendo falar com você aqui.
- Comigo???? Mas, mãe, quem?

Em Juiz de Fora eu não conheço ninguém que quisesse falar comigo no telefone. Mas, ela sequer me escutou e já foi dando o celular pra "tal pessoa".

- Alô, Marina?! - a voz era suave.... baixa... rouca...
- Sim....?!
- Sabe quem é?
- Não....
- É o Papai Noel !! Ho Ho Ho!
- Oi?????

Claramente o fofo do Papai Noel percebeu que, do outro lado da linha, não era uma menininha. 

- Você tem quantos anos?!?!?!?!
- Vinte e sete. Eu não acredito que minha mãe fez isso....

O cara ficou desconcertado. Eu só escutava lá no fundo ela rindo:

- Fala com ela, fala com ela. Ela é minha eterna criança. 

Eu queria matar a minha mãe. 

- Então, Marina, qual seu pedido de Natal?
- Uma mãe menos maluca, Papai Noel. Só isso!





segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Apple Cia ID Nanci

Sempre que minha mãe está no Rio, meu irmão de 9 anos quer ir ficar com ela... Fofo? Que nada! Ele gosta mesmo é de ficar no computador... Ela é a unica que deixa ele usar por hooooooras.... 

Da última vez que ele foi lá pra Copa, ela não estava com o computador. Tava só com o iPad.

- Mas eu sei mexer no tablet.... - Disse Pedro.

E sabia mesmo. Ele foi no Apple Store e achou o jogo que ele adora. 

- Posso baixar? É grátis, Marina.....
- Pode, Pedro.
- Eba........

Mas o Apple Store logo pediu a senha do usuário da conta.

- Marina.... a senha...?
- Mãe.... Qual a senha? É aquela que eu fiz pra você, né?
- Acho que sim, Marina.... Coloca ai.....

Tentei umas 3x. Nada. 

- Mãe, você trocou a senha?
- Eeeeeu.....? Ahhh, acho que sim.
- Ihhhh, mãe, não pode ficar trocando essa senha não..... Agora eu quero ver se você lembra a nova....

Depois de umas 10 tentativas, ela desistiu. Pedro já tinha dormido no sofá, e eu estava puuuuuta...

- Mãe, não se troca senha da Apple assim! Isso é algo fixo, eterno!!!! Pelo amor de Deus!!!!!!!!!!
- Ihhhhhhhhhh....... Me da aqui, Marina. Vou resolver...

Eu fui dormir.

No dia seguinte, acordei com ela me chamando...

- Marina, Marina, consegui! Essa desgraçada da Apple pede uma letra maiúscula, número, sei lá mais o que.... Que absurdo!!!!!! Eu aposto que é porque eles sabem que Cherfen é árabe, Marina. Isso é coisa da CIA... Ahhhhhh Meu Deus....

- Não, mãe, é regra geral..... 

- Marina, minha filha, você sempre tão ingênua.....

E o pior é que ela tem certa razão.

quinta-feira, 7 de agosto de 2014

C&A Nela!

Na última vez que estive no Rio, fui visitar minha afilhada na Barra. Minha mãe quis ir comigo, mas ficou no Barra Shopping.

A gente ia muito ao “Garra Shopping” quando eu era pequena. Eu chamava o shopping assim a e até hoje falamos dessa forma.

Deixei ela lá de carro e fui ver a Carol. Depois de umas 3 horas, liguei pra avisar que estava saindo. Minha tia também tinha ido pro shopping. Estavam lanchando… Combinei com a minha mãe de encontra-las na porta (de saída) do C&A.

- Fala pra minha tia me esperar que quero ver ela.
- Tá. Tô na saída superior... 
E desligou.

Fazia muito tempo que eu não ia no Garra Shopping. Eu não lembrava se a C&A tinha saída pra “rua” ou não.  

Achei uma saída da loja no andar inferior. Mas lembrei do que minha mãe tinha dito: saída superior do C&A. OK.

Subi e dei uma volta no shopping procurando a saída da C&A. NADA. 
Dei outra volta. NADA.
Perguntei ao segurança: 

- Ali, ó...

Parei o carro na frente da suposta saída. NADA.



- Mãe, cade vocês?????
- Ué, Marina!!!!!!! Aqui na saída do C&A…. AHHHHH MEU DEUS!!!!!!!!
- Mas eu já dei mil voltas….. Perai.

Desliguei, e dei mais uma volta. NADA.

Nesse momento, eu já tinha perdido as esperanças de sair sem pagar o estacionamento. Já tinha uns 20 minutos que eu tava rodando...

Toca o celular:

- Marina???????????????????????? Cadê você, gente?????????????????????????
- Olha, mãe…….Tô muito p.......

Desliguei de novo porque começaram a buzinar. Aí... me deu um click. Estacionei o carro e entrei no shopping. 

Quando eu tava me aproximando da C&A…

- MARIIIIIIIIIIINAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAA…….

O shopping PA-ROU. Todo mundo olhou pra ela. E pra mim. Pra ela. E pra mim. A moça da Central de Informações, que estava ao lado dela, quase infartou. Minha tia, que sempre chora com tudo, dessa vez riu.
E lá estavam elas; na saída superior da C&A. 

- Mas, mãe, eu não disse que ia passar de carro????? Era na saída pro lado de fora do shopping!!!!!!!!!!
- Ahhhhhhhh Meu Deus……..Você é muito confusa, Marina. Vamos tomar um café. 

E saindo me puxando pelo braço...

Respirei fundo, lancei o meu mal humor pro lado e fui tomar um belo café com bolo com as duas.  


domingo, 3 de agosto de 2014

Aprendendo a ser humana.

Eu sempre fui de perdoar até mesmo quem não me pedia perdão. Podem falar que isso é grandioso, mas pra mim sempre foi um peso imenso. Pra perdoar, eu procurava minha culpa nos acontececimentos, e tendia sempre a ver as minha atitudes como mandatórias de algum final infeliz. É muito ruim viver se culpando de coisas que nem sempre são culpa sua. 

Acho que como todo (ou quase todo) taurino, eu sou uma pessoa que preza pelo bem comum. Gosto de justiça e acredito nas pessoas. Um taurino (em sua essência) é incapaz de fazer o mal intencionalmente a alguém, mas, de qualquer forma, pode ter atitudes bastante destrutivas.

Foram 9 anos de análise e inúmeros outros (e eternos) de auto análise para descobrir que meu pior defeito é gostar das coisas exaustivamente claras. Já errei muito em prol de deixar tudo "esclarecido de forma verdadeira", de explicar qual o real motivo de cada coisa que eu fiz, ou tentei fazer. 

Uma das grandes verdades da vida é que você nunca (nunca mesmo) vai conseguir que as coisas fiquem totalmente esclarecidas com todo mundo. Simplesmente porque muita coisa na vida não tem explicação. E explicar o inexplicável não faz sentido algum.

Eu demorei muito a entender isso. Na verdade, ainda não é tão lógico na minha cabeça. Quer dizer, lógico até é, mas não é de fácil aceitação. Porque uma das coisas que eu sempre odiei na vida é "ficar mal com alguém". Se alguma coisa acontecia, eu fazia de tudo para tentar esclarecer as coisas. Mas... muitas vezes não dava certo e o clima todo piorava. 

Minha psicanalista sempre me disse: "é louvável você querer esclarecer as coisas com as pessoas explicando seus motivos, o que você acha e sente. Mas nem todo mundo está disposto a ouvir as coisas que você tem a dizer". Eu lembro sempre dela me falando isso, mas sempre teimei demais na arte de tentar fazer todo mundo me entender.

Cansei. E pior, fracassei. Desse objetivo utópico, sai imensamente machucada e desgastada. E não por culpa de quem não quis me ouvir, ou de quem não quis me entender, mas por culpa minha. Ou melhor, por responsabilidade minha. Eu travei essa batalha comigo mesma, e me exigia algo que nem mesmo o outro exigia. 

Quando alguém não quer te entender, ou não tem o mesmo objetivo de deixar alguma situação bem resolvida, você pode fazer de tudo, de tudo mesmo, que nada ficará bem esclarecido. Pelo contrário, tudo fica mais desgastado: a situação, você e o outro. E isso alimenta aquela cisma de culpa, que por consequência faz você querer se explicar, e impulsiona todo um círculo vicioso e cruel. 

Eu adoro frases, e acho que todo mundo sabe disso. Na verdade eu gosto da palavra e das palavras juntas formando signficados. Concordo com Adelia Prado quando disse que o sentimento é a coisa mais fina do mundo. Acho mesmo; e acredito que as palavras são uma forma sincera de demonstrar sentimentos.

Voltando a frases, hoje li uma que bateu e ficou em mim. Tem coisas que a gente lê que simplesmente passam pela gente. Outras que batem mas passam. E outras batem e ficam. Essa bateu e ficou. "Deixe solto. Se não houver procura, não há interesse. E se não há interesse, não vale a pena."

Isso vai totalmente contra a teoria que eu tinha com pessoas, relações e situações. Mas se realmente não vale a pena, que fique pra trás, que vire passado e que não custe mais um segundo da minha, possível, paz.




terça-feira, 29 de julho de 2014

2 Anos de São Paulo.

2 anos. 730 dias. 17.520 horas. Esse é o tempo que moro em São Paulo.

Lembro do dia que eu sai do Rio rumo à cidade da Garoa. Era domingo, dia 29 de Julho de 2012. 

Deixei pra fazer a mala no próprio domingo. Passei o dia arrumando as minhas coisas. Chorei o dia inteiro. Um choro angustiante e inconsolável. Como uma boa taurina, tentei ser durona mas fracassei completamente.
Minha mãe ficou o tempo inteiro na porta do meu quarto, parada, em pé, me olhando…. Com aqueles olhos de mãe que entendem perfeitamente a dor dos filhos, mas tentam se manter firmes. Eu jamais tinha pensado em sair do meu Rio de Janeiro. 

São Paulo passou de uma hipótese para uma realidade em um mês. É engraçado como a vida muda de repente. Nasci e cresci no Rio. Apesar da minha cor, sou extremamente carioca. Gosto do jeito despojado que a gente vive e leva a vida. Ser carioca é um estilo de vida, e tenho orgulho de ter esse estilo. Com a gente não tem muito “mimimi”; a gente sai na rua como quer, anda como quer, se veste como quer, é extremamente extrovertido e receptivo.

Cheguei em São Paulo com os olhos inchados, mas já estabilizada. Nunca fui de gostar muito de mudanças…. Mas sempre que elas vêm, tento encarar de frente. Lembro do meu pai falando comigo quando eu era pequena e estávamos no mar:

- Quando a onda vier, mergulha bem fundo. Aí ela vai passar sem você sentir nada. Mas se ela te pegar de surpresa, mantenha a calma, e enfrenta.

Enfrentei São Paulo como se fosse uma dessas ondas surpresas. 

Os dois primeiros meses não foram fáceis. O Rio era meu porto seguro. Eu morava sozinha, trabalhava numa agência que eu adorava, tinha a família por perto, muitos amigos… E de repente, tudo tinha mudado. Eu era realmente “um estranho no ninho”. Só que aí entra a característica do ser humano que mais admiro: somos adaptáveis. A gente sente muito quando as coisas mudam, mas se adapta. Sempre pensei que, se uma mãe sobrevive e volta a sorrir depois da perda de um filho, todo o resto é passível de superação. Sei que é um pensamento triste, mas pensar assim me facilita muito as coisas.

Nunca me mudei efetivamente. Eu fui trazendo coisas. Alguns falam que isso ajuda o processo. Outros falam que dificulta. No meu caso eu acho que facilitou, porque fui deixando o Rios aos poucos; a separação foi menos traumática.

Passei o primeiro ano indo ao Rio quase todos os finais de semana. Curtindo o Rio como turista, não mais como moradora. Mas o corpo e a mente começaram a reclamar. E São Paulo foi se sentindo diminuída. Depois de um ano, toda vez que eu ia pro Rio, chovia. Era como se a cidade chorasse com tamanha ingratidão da minha parte.

É bem verdade que eu demorei a chamar São Paulo de realidade. A noção do real, da nova vida e de todas as possibilidades que vinham com ela só ficaram nítidas depois de um ano morando aqui. Fui aprendendo que toda aquela rixa entre paulista e carioca não fazia sentido nenhum. É claro que os paulistanos adoram zoar o meu sotaque carregado, dizem que eu falo “cheia de marra”, mas tudo não passa de uma implicância boba e saudável. Eu adoro os paulistanos. Adoro São Paulo. Adoro tudo que a cidade tem me permitido viver nesses dois anos. Até mesmo, a ficar longe do Rio.

A verdade é que São Paulo tem uma doçura diferente. Disfarçada de cinza, é bastante colorida e, se você abrir o coração, vai poder conhecer uma cidade realmente incrível. No caos que ela representa, manter o equilíbrio e os reais sentimentos se torna extremamente necessário. E, consequentemente, torna o ser humano mais humano.

Aqui tudo é mais corrido, mais competitivo, menos pessoal, mais genérico. Mas tudo isso leva você a você mesmo, a um questionamento de quem você vem sendo e quem você realmente quer ser. É besteira falar que São Paulo “desumaniza” as pessoas. Como diz Nietzsche: “É necessário ter o caos cá dentro para gerar uma estrela."

Eu tô gerando a minha. Obrigada, São Paulo. 


domingo, 20 de julho de 2014

Bocatime

Quando comprei um iPhone novo, minha mãe ficou com o antigo. A ideia era facilitar a vida dela...

Um dia, eu estava no trabalho e meu celular tocou. Era ela. E uma surpresa: chamada de Facetime! 

- Oi, mãe!!
- Pois é... Mas parece que o médico é bom, né?
- Mãe? Alo??
- Ah é... Fui indicada pela fulana... Ai vim.
- Mãe?!?!?!

Demorei um pouco para perceber que ela tinha ligado por engano. 
Depois de quase 5 minutos, ela percebeu que tinha "alguém" falando no celular.

- Alo?!?!!?!??!?! Marina?!?!?!?!?!
- Oi, mãe... Tô ouvindo toda a sua conversa aí no consultório.. Você me ligou sem querer...
- Eu????? Mas tava escrito aqui Facetime. Que negocio é esse de Facetime?? Tá escrito "conectando, conectando"... Que isso, gente?
- Ué, mãe, é uma forma de ligação que você pode falar e ver a pessoa ao mesmo tempo.
- Quê?????? Ver???? Que palhaçada.. Marina, aqui não tem face nenhuma...
- É, acho que você ligou sem a função de vídeo....
- Quê????? Marina, você está brincando comigo? Você que ligou, não foi?!
- Claro que não, mãe... Tá doida?
- Por acaso você está me vendo, Marina?! Me diz o que tô fazendo...

Eu já tava morrendo de rir, sem conseguir falar nada.

- Fala, Marina, fala. O que eu tô fazendo?? Comigo não tem essa não... Comigo é Bocatime, palhaça. 
E desligou. 


domingo, 6 de julho de 2014

Uma lição de vida chamada Clarice.

Quando você é filha única até 11 anos, a última coisa que você não quer é deixar de ser. Pois é, mas aconteceu comigo. Aos 11 anos eu soube que teria uma irmã. Odiei. E não foi algo breve; odiei durante os 9 meses que a Clarice estava na barriga da Teresa. Mas foi ela nascer que eu fiquei totalmente apaixonada. É incrível a magia de uma criança; faz você se encantar imediatamente por ela. 

Hoje somos quatro filhos, mas foi Clarice que me ensinou a amar incondicionalmente aos 11 anos. Foi Clarice (que nasceu da poesia de sua xará) que me fez descobrir a felicidade de ter uma irmã. De dividir o que eu adorava chamar de “só meu”. De me permitir pensar que eu nunca vou estar sozinha.

Lembro que, quando Clarice nasceu, eu falei pro meu pai: “Pai, você não vai gostar mais dela do que de mim.”. Ele me respondeu calmamente: “Claro que não, Marina, eu gosto de você há 11 anos. Ela nasceu agora!”. Na época a explicação dele me fez todo o sentido. Hoje, eu entendo perfeitamente que amor não se mede. Os nove meses que não curti a ideia de a Clarice existir foram ferozmente esmagados com a notícia do seu nascimento. E olha que eu só a vi no segundo dia de vida. Mas foi saber que ela tinha nascido, que eu me apaixonei completamente.

Hoje Clarice faz 21 anos. Eu nem sei dimensionar o tamanho do meu amor por ela. É minha irmã, minha amiga, minha confidente, minha eterna parceira. É muito bom ter uma irmã. Ainda mais sendo você, Clarice.



segunda-feira, 9 de junho de 2014

Eu era feliz e não sabia...


Quando eu era pequena, morei na Gávea até os meus 11 anos. Morava num prédio com uma pracinha na frente (que existe até hoje), entre duas ruas. As duas sem saída. Na verdade, uma tinha saída mas era pouco movimentada.

Esse prédio era vizinho de dois outros prédios, que também frequentavam a mesma pracinha e as mesmas ruas. No total, éramos umas 30 crianças brincando entre a pracinha e as duas ruas sem saída.

Minha maior vontade naquela época era chegar da escola e “descer pra rua”. Mas antes, claro, eu tinha que fazer o dever. Minha mãe sempre foi muito liberal, mas existiam regras. Primeiro o dever, depois a brincadeira.

- Marinaaaaaaaaaa, desce.
- Agora não, gente. Marina está fazendo dever. Já já ela desce. - Dizia minha mãe com a cabeça na janela. 

A gente brincava de amarelinha, elástico, andava de bicicleta e, claro, Polícia e Ladrão. Todo mundo lembra dessa, né?

A gente brincava muito de Policia e Ladrão, até porque pique-esconde com 30 crianças não tinha como dar certo. Então era um grupo de polícia e outro de ladrão, que tinha que se esconder da policia. 

Tinha gente que ia pra pracinha, que pulava o muro pra ficar do outro lado escondido, que se escondia atrás dos carros ou embaixo deles, que subia a “rua de lá” porque era deserta e escura…. Sem dúvida alguma, era a brincadeira que a gente mais gostava. E o mais legal: era unissex; tanto os meninos quanto as meninas brincavam juntos, em grupos misturados.

No último dia das Mães, eu estava conversando com meus pais sobre "os tempos da Gávea". E falamos sobre a famosa Polícia e Ladrão. Meu irmão de 9 anos, olhou rápido pra mim e disse: 

- O que, Marina? Onde? - já vindo pro nosso lado procurar refúgio. 
- Não, Pedro, era uma brincadeira que eu adorava quando eu tinha a sua idade.

Nenhuma palavra saiu da boca dele, mas os olhos disseram: “Doida”.

De lá pra cá, eu fiquei pensando... Hoje, Polícia e Ladrão certamente seria uma brincadeira proibida pelo Conselho Tutelar. Quando que uma criança poderia hoje brincar na rua, de uma brincadeira chamada Polícia e Ladrão? No mínimo, os pais seriam acusados de descuido e o nome teria que ser mudado.

O nome não me parece fazer mais sentido mesmo. Hoje, nossa sensação de insegurança é gigante e as perseguições entre polícia e ladrões de verdade são polêmicas e catastróficas. O que era a minha brincadeira favorita de criança virou uma realidade assustadora pro meu irmão.

domingo, 1 de junho de 2014

Marina, a irresponsável.

Meu primeiro estágio foi num escritório de Design no Centro do Rio, na Avenida Presidente Vargas. Eu saía da faculdade direto pra lá. Almoçava qualquer coisa pelo Centro mesmo. Ou então, um sanduíche dentro do ônibus. Vida de estagiário.... Quem nunca?

Fiquei quase 1 ano nesse escritório, e lembro que peguei vários daqueles dilúvios que caem no meio da tarde e inundam as ruas até o joelho da gente. Quem mora no Rio sabe: a cidade para.

Quando isso acontecia na hora de eu ir embora, eu esperava um pouco a situação melhorar. Mas em alguns dias eu tive que sair. 
É sobre um desses dias que eu vou escrever hoje.

O prédio do meu estágio ficava em frente à Estação Uruguaiana, do outro lado da Presidente Vargas. Cá entre nós, eu adorava trabalhar ali. Eu adoro o Centro do Rio, mesmo com todo aquele furdúncio recorrente. Minha mãe foi criada no Centro e eu nasci na maternidade Promatre, também no Centro. Talvez por isso eu goste.

Bem, desci e consegui atravessar a Presidente Vargas. Fui até as escadas da estação Uruguaiana e parecia um rio. Andei até a Rio Branco, que estava cheia até o meu joelho. Voltei. Esperei uns 20 minutos e resolvi enfrentar as águas das escadas da Uruguaiana.

Deu tudo certo. Cheguei e entrei direto no terminal. Como eu costumava pegar o metrô na volta, sempre mantinha o cartão do metrô carregado. Isso salvava a minha vida na maioria das vezes, porque a fila dos guichês do metrô às 18:30 no Rio de Janeiro são quilométricas.

Por incrível que pareça, entrei no vagão facilmente e consegui sentar. Toda encharcada, mas aliviada porque ia descer super perto de casa. Ufa.

O celular toca. Toda confusa com o material de faculdade, bolsa, guarda-chuva, não consegui atender. Toca de novo. 

- Alô.
- Marina????
- Oi, mãe. Ufa...
- Onde você está? Vi que no Centro está tudo cheio..... Espera melhorar.... Não sai do trabalho.
- Mãe, já sai. Não dava pra enfrentar a Rio Branco, mas consegui pegar o metrô. Já já tô em casa.
- O quê????
- Mãe, tô no metrô. Tá um caos mesmo... Mas consegui pegar o metrô.
- MA – RI – NAAAAA! Você só pode estar brincando!!!!! - a fala era realmente pausada.
- Ué, mãe, por quê??
- MARINAAAAA, pelo amor de Deus, um dilúvio desses e você vai pro metrô???? Será que você não aprendeu que, quando chove muito, a gente tem que se manter em cima e não ir pra baixo...?!
- Mãe.......
- Olha.... I- NA-CRE-DI-TÁ-VEL.....Uma garota inteligente fazer uma coisa dessas.... O metrô virando rio e você... entra no rio....!
- Mãe, a Rio Branco que estava um rio.... Não tinha como ser de outro jeito...
- Ahhhhhhhh, Marina..... (com aquele tom de quando eu tinha 6 anos e aprontava alguma coisa que ela não gostava).
- Mãe, falamos em casa, tá?
- Onde você está?
- No metrô, meu Deus!
- Mas onde?? Comprando bilhete?
- Não, mãe. Já no vagão, indo pra casa....
- O queeeeeeeeeeeeeê?
- Você está usando o celular dentro do metrô?
- Ué, mãe, tô.... Pode usar.
- Olha, Marina, SIN-CE-RA-MEN-TE...... Se você quer arriscar a sua vida, problema seu. Agora colocar a vida dos outros em risco????

Eu já não conseguia falar direito de tanto rir. E, claro, as pessoas me olhavam assustadas.

- Mãe... Deixa eu te explicar... Pode usar!
- Ahhhhh sei, sei.... Se não pode em avião, por que vai poder no metrô? Ah, MEU DEUS...

Eu não conseguia mais falar nada.

- Olha, Marina..... TCHAU.

E desligou o telefone. Claro, voltei a ligar.
Chamava.... chamava.... chamava... e caía.
Eu insistia....
Chamava.... chamava.... chamava... e caía.
De novo...
Chamava.... chamava.... chamava... e caía.
Até que...

- Marina, para de ligar! Eu não vou atender. Irresponsável!

E desligou. Voltei a ligar.
Chamava.... chamava.... chamava... e caía.
Foram umas 4 tentativas...

- Olha, Marina, vão te chamar atenção aí, viu? Que ABSURDO. EU NÃO QUERO FALAR. IRRESPONSÁVEL. TCHAU.

E batia o telefone na minha cara.

Nisso, já era a minha estação. Desci morrendo de rir. Ainda chovia, mas bem menos. 
Nem me dei ao trabalho de abrir o guarda-chuva. Fui rindo incontrolavelmente e tomando chuva. Uma coisa que a gente faz pouco, mas deveria fazer mais. É bom. 

Cheguei em casa ensopada. Quando abri a porta, veio ela lá de dentro como um furação. Esbravejava com meu pai no telefone....

- Ahhhhhh!!!!!!! Ela chegou, Clersio. Deixa eu ir.

Eu ainda tive que escutar mais uns 30 minutos de esporro. 
Ah, importante! Até hoje ela acha que tá certa.